terça-feira, 16 de novembro de 2010

Ação coletiva, por que é tão difícil?

Você já se perguntou por que é tão difícil mobilizar um grupo de pessoas? Afinal de contas, por que tanta gente ainda dá tão pouca importância ao voto, problemas ambientais e até mesmo problemas sociais locais?

Por que o ser humano é tão desinteressado nos problemas que afetam a ele mesmo?


Bom, a resposta que eu trago é uma teoria, muito bem fundamentada, muito bem aceita nas ciências sociais mas ainda só uma teoria, mas que pode ajudar muito a entender o problema e pensar em soluções.


Partimos da premissa (não absoluta) de que os seres humanos são racionais (do ponto de vista de Adam Smith), ou seja, buscam calcular o resultado de suas ações afim de maximizar seus lucros ou minimizar seus prejuízos.

Para o sociólogo e economista Mancur Olson (1971) esse indivíduo racional, ao agir racionalmente no âmbito individual, acaba por ser irracional no âmbito coletivo, gerando o conhecido Paradoxo da Ação Coletiva de Olson.


Olson se utiliza da ilustração do dilema do prisioneiro de Hardin (1982) para demonstrar esse problema.


Nessa situação temos um indivíduo racional (A), que possui duas opções cooperar na ação coletiva (votar por exemplo) ou negar sua cooperação (vender seu voto, nulo, branco etc.). Temos também a posição dos outros envolvidos na ação, também com as duas opções.

Analisemos então as combinações possíveis em uma situação hipotética de limpeza da rua do bairro.

 - O indivíduo (A) coopera e "Outros" negam - O nosso sujeito (A) gastou seu tempo e esforço para limpar a rua enquanto todos os "outros" não fizeram nada. Nesse caso (A) teve o pior resultado possível, pois teve que fazer tudo sozinho, enquanto "outros" tiveram o melhor resultado possível, pois não fizeram nada e ainda tiveram a rua limpa. Ganho 1 para (A) e 4 para "outros".

- O indivíduo (A) nega e "Outros" também negam - Ninguém fez nenhum esforço em vão, portanto não perderam nada, porém também não tiveram a rua limpa, portanto um resultado intermediário. Ganho 2 para todos.

- O indivíduo (A) coopera e "Outros" também cooperam - Todos desperdiçam esforço igualmente, ninguém fica sobrecarregado e o resultado é alcançado. Ganho 3 para todos.

- O indivíduo (A) nega e "Outros" cooperam - pensando individualmente é o melhor resultado possível, afinal o indivíduo (A) não faz nenhum esforço e ainda colhe os frutos do trabalho alheio, tendo sua rua limpa. Ganho 4 para (A) e 1 para "outros".

Com essa ilustração fica claro que o individuo racional ficará tentado a ter o maior lucro possível negando a sua participação em todas os aspectos, buscando atingir o resultado 4 (ótimo) ou 2 (não tão ruim) ou invés de 3 (não tão bom) ou 1 (péssimo).

Então o ser racional sempre negará sua participação afim de pegar uma carona (Free-rider) na ação alheia.

Agora voltemos a nossa premissa, o ser humano é, em quase sua totalidade, racional. Portanto se quase todos são racionais, quase todos vão negar sua participação então teremos SEMPRE o resultado 2 para todos.

Bom, o resultado disso conhecemos muito bem, as eleições são decididas por uma minoria de interessados, que defendem seus ganhos próprios com unhas e dentes.

Imagine se eu, você e nossos amigos nos envolvêssemos com força total para defender os interesses coletivos?

Para isso teríamos que ser um pouco menos racionais, proposta de um outro sociólogo, John Elster (1989), do qual posso falar em outro post. Também podem buscar mais informações nas referências abaixo.


Abraço!!!

Atila Indalecio


Referências:


ELSTER, John. The cement of society. New York: Press Syndicate of the University of Cambridge. 1989.
HARDIN, R. Collective Action. London: John Hopkins University Press. 1982.
OLSON, M. The logic of collective action: public goods and the theory of groups. Massachusetts: Harvard University Press. 1971.

Artigo Publicado no EnANPAD


9 comentários:

  1. Ótima abordação,
    Temos que lembrar o papel de cada um na melhoria da qualidade de vida, afim de estar acabando com este tipo de "acomodação".

    ResponderExcluir
  2. Eu, particularmente, não gosto dessas teorias que "generalizam" um comportamento.

    Acredito que seja uma questão cultural.

    O povo brasileiro raramente pensa no bem coletivo, salvo poucas exceções.

    Mas os povos que conseguiram chegar a um nível de desenvolvimento bem mais avançado que o nosso, conseguiram justamente por ter esse pensamento. De colocar o todo como prioridade.

    Os Europeus e alguns países Asiáticos tem enraizado esse comportamento.
    O Japão por exemplo parece uma engrenagem.

    A necessidade também contribui para que culturamente alguns povos serem mais coletivos, como os ìndios. Pois, ou trabalham em prol da comunidade ou a comunidade deixa de existir.

    Até o comportamento dos animais é mais coletivo do que o de muitos "racionais".

    Portanto, creio que a cultura ou a falta de cultura seja o principal aspecto desse comportamento.

    ResponderExcluir
  3. Jr. a generalização não é o objetivo, como expliquei no inicio, justamente por se uma teoria não pode ser generalizada.

    O principal ponto fraco dessa teoria é justamente a premissa. O ser humano não é 100% racional.

    Você está certíssimo ao colocar a cultura como fator importante para o pensamento coletivo. É justamente nesta base que o sociólogo John Elster fundamenta a sua abordagem das normas sociais. É justamente por causa de normas sociais (cultura, usos e costumes) que os japoneses são tão coletivos.

    Só temos que tomar cuidado pois uma abordagem não é contrária a outra e sim complementares. A escuridão não é contrário da luz e sim a sua ausência.

    Para finalizar é importante termos esse senso crítico que você teve, todas as teorias servem apenas para explicar mais um pedaço da realidade, afim de nos ensinar um pouco mais sobre o fato.

    A certeza é inútil.

    ResponderExcluir
  4. Acredito no que foi dito, e a questão cultural foi incutida em todos nós através dos séculos. A verdade é que estamos aí para a quebra destes paradigmas. A necessedidade de canalizar e conscientizar a população na construção de novos valores coletivos para a melhoria da qualidade de vida. Importante é pensarmos duas vezes antes de não dizer nada. O silêncio a falta de críticas construtivas, acarretam a falta do debate voltado para a melhoria. Esse tipo de discussão é fundamental para sairmos da teoria.

    ResponderExcluir
  5. A solução está em se criar essa cultura. É a busca se valorizar valores morais acima da racionalidade.

    ResponderExcluir
  6. Teria que acontecer algo que nos trouxesse uma transformação muito grande para que o povo criasse essa cultura.
    Ou então esperarmos muitas décadas até que educação do País melhorasse muito e pudesse desenvolver novas gerações com mais inteligência e comprometimento com o próximo.

    Ambas as soluções beiram a utopia.

    ResponderExcluir
  7. A verdade que nós temos que introduzir tal pensamento entre nossa rede de relacionamento, na tentativa de melhoria daqui para frente, é uma mudança de concepção.

    ResponderExcluir
  8. Concordo com ambos. A mudança é lenta e beira a utopia, mas nem por isso devemos desanimar. Temos mesmo que começar dentro de nossa casa e entre os amigos, daí para fora.

    ResponderExcluir
  9. Com certeza, surge de dentro para fora esta mudança.

    ResponderExcluir